terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

A teoria do valor sem valor




Antigamente, no século XIX, um véio barbudo bateu com o martelo na bancada e  decretou:

"Sabemos que o valor de qualquer mercadoria é determinado pela quantidade de trabalho materializado em seu valor-de-uso, pelo tempo de trabalho socialmente necessário a sua produção.” (Barba Ruiva, 1867) 

Daí surgiu uma "tiuria", a "tiuria do valor-trabalho", muito famosa. Para esta obra prima do intelecto humano, todo lucro só pode advir do trabalho. Você sabe como os "J"ênios são, né!? - Eles sempre acertam na mosca. Então, vamos ver como fica essa "tiuria" aplicada ao dia a dia?! Ou seja, será q ela tem “valor” empírico?! Acompanhe as estórias:

 - João foi comprar carne pra fazer um churrasco com amigos. Chegando ao açougue, João perguntou quanto custava o KG da picanha. O açougueiro respondeu: "20 pila". Logo após, João perguntou o preço do coxão mole (é professor, tadinho). - O açougueiro responde: "10 pila". João, lembrando-se de sua aula de sociologia da faculdade, faz a perspicaz pergunta: "Qual deu mais trabalho para preparar" !? O açougueiro, sem entender qual era a do rapaz, responde: “ Ahh... As duas deram o mesmo trabalho, sô! Que pergunta esquisita!!”  

 - Maria adora música, então, foi à loja comprar CDs. Ela viu o preço do CD de Villa-Lobos: 15 R$.  Muito eclética, ela foi ver o preço do CD de Michel Teló: 40 R$. "Será que essa diferença de preço se deve a quantidade de trabalho empregada na confecção do CD" ?! Pensou Maria.

 - Jardilene adora sapatos caros. Metida feito só foi direto na "Louis Vuitton". - Preço: 2.000 R$. Saiu de fininho e comprou um par muito semelhante com o mesmo material por 200 R$ na lojinha ao lado. Será que o sapato da Vuitton deu cerca de 10x mais trabalho para ser produzido do que o que comprei !? Pensou Jardilene, colega de João e de Maria na mesma faculdade.


E agora, Barba!? Se aproximadamente tudo deu o mesmo trabalho de preparo, tudo o mais constante, então, como explicar para estas pessoas a diferença tão brutal de preços!? Como sua teoria ajuda a explicar isso?





Fácil essa: NÃO EXPLICA. E nem precisa, pois os dogmas não precisam de provação empírica, são  apenas questão de fé. Fé não se discute e ponto final. Então a teoria do valor-trabalho não tem valor algum. É com essa “teoria do valor sem valor” que os socialistas do passado justificaram suas barbaridades, alegando que lutavam contra a suposta exploração que advinha da noção de valor do barbudão do martelo. É com base nessa mesma teoria que os socialistas de hoje se ressentem do mundo e dos empresários, os quais julgam serem “exploradores”. - Foi com base nessa “tiuria” que o Barba exigiu a “derrubada de toda ordem social vigente”. Os acadêmicos socialistas posteriores ao mestre não souberam procurar onde esta o valor das coisas, fizeram como o guru, procuraram no lugar errado.  –  O valor das coisas está na cabeça dessas pessoas, Barba, não no objeto. Esta na cabeça do João, da Maria e da Jardilene. É a avaliação que as pessoas fazem desses produtos que explica porque Michel Teló dá mais lucro que Villa-Lobos, não tem nada a ver com a quantidade de trabalho. - Fazer o que, né!? Derrubar toda a ordem social vigente por conta disso!?   


quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Como o marxismo entrou na lingüística?



Como foi dito antes neste blog, os salafrários da intelligentsia marxista, parasitas de plantão, encontraram nas ciências humanas o seu nicho ambiental e fizeram das universidades seus hospedeiros ideais. Então, a doutrina marxista começou a se apossar da história, da sociologia, da pedagogia e da filosofia. Mas, e a lingüística? Qual foi a artimanha que o marxismo fez para penetrar nesta disciplina de tradição rígida e pragmática? A lingüística, como sempre se pautou em descrever as línguas mundo afora, deixava pouco espaço para inferências de cunho ideológico, mas, com o acréscimo de prefixo "sócio-", a coisa ficou fácil. Surge então a sociolingüística.

A sociolingüística parte de uma premissa verdadeira: a de que todas as línguas variam, se dividindo, com o passar do tempo, em dialetos. Mas não pára por aí. A sociolinguística que vem sendo feita no Brasil encontrou nas variações dialetais a oportunidade de incutir o mais famigerado preceito marxista: a luta de classes. Adeus Saussure, Bloomfield e Martinet. Bem-vindo, Karl Marx.

Então, os marxistas, agora usando as credenciais da lingüística, trataram logo de identificar quem são representantes das “classes dominantes” no contexto das variações dialetais para assim elegerem seu inimigo: o padrão linguístico. A língua padrão é aquela que encontramos quando lemos um texto formal ou consultamos uma gramática. É verdade que os manuais de gramática atuais estão pra lá de desatualizados e pouco favorecem o ensino da língua padrão, mas a questão aqui é outra. Para os sociolingüístas, a exigência do domínio da língua padrão não passa de uma imposição ideológica em que a cultura de uma classe suplanta as demais. Pronto, daí já se pode vislumbrar o efeito desta premissa no ensino de língua portuguesa e todo discurso ideológico que dela deriva. Muitos manuais de lingüística viraram então cartilha de pregação, mais preocupados em atacar as gramáticas tradicionais do que propriamente ensinar algo sobre morfologia, sintaxe ou fonologia a fim de munirem os estudantes de letras do que é necessário para a descrição das variantes dialetais, objeto que, supostamente, era para ser estudado pela sociolingüística. Porém, quando se compara a literatura acadêmica daquilo que foi produzido por estes autores, encontram-se pouquíssimas descrições das variações dialetais, ao passo que o discurso marxista é exaustivo:

“Tal cultura é arbitrariamente imposta, já que, na relação pedagógica em si mesmo, abstratamente considerada, nada há que leve a instituir a matriz da classe dominante como cultura referencial exclusiva a transmitir. Objetivamente, a ação pedagógica reveste-se, assim, de violência simbólica, pois decorre da imposição, por um poder arbitrário, de uma cultura também arbitrariamente selecionada e que de forma alguma pode ser deduzida de princípios universais. Na realidade, essa seleção é arbitrária porque se baseia nas relações de força entre grupos sociais (Bourdie & Passeron,1975).

O papel que a norma¹ desempenha nesse jogo é obvio: o valor simbólico das variedades linguísticas disponíveis está em função da distância que as separa da variedade padrão que a escola impõe. A instituição não reconhece a legitimidade da variação linguística, muito pelo contrário, acaba por submetê-la ao critério da correção.”  
Fonte: CAMACHO, R.G. Sociolinguística parte II. In: Mussalin, F; Bentes, A.C (orgs).Introdução à linguística: domínios e fronteiras. Vol. I


Entendeu o que está envolvido aí, leitor? A variedade padrão de uma língua é na verdade um instrumento manipulável pela "classe dominante". Como se houvesse um grupo extremamente organizado, no melhor estilo Illuminati, onde todos falam e escrevem como Rui Barbosa e que fica por conta de fazer conluios a fim de instituir sua variedade linguística como "referencial exclusivo a transmitir". Ou seja, a língua portuguesa padrão supostamente ensinada nas escolas é resultante da luta de classes, da opressão que a classe dominante exerce sobre a classe dominada. Tal variedade não tem nenhum valor útil, como, por exemplo, manter uma certa regulação entre o que os vários indivíduos de uma nação escrevem. Tudo não passa da implacável luta de classes que o profeta anunciou em seu evangelho. Sociólogos como Bourdieu e seus discípulos da sociolingüística são os anjos do paraíso proletariado, prontos para proteger o povo do suplício, da violência simbólica que é o ensino de redação e gramática.

Acontece que essas sandices não têm o menor valor empírico, como tudo que essa ideologia cega produz. Para refutar um delírio destes, basta sintonizar o rádio na estação da Câmara dos Deputados e ouvir um pouco da "matriz da classe dominante". Qualquer ser em sã consciência irá concluir que aquilo, definitivamente, não é nem um pouco parecido com a variedade padrão. Ou seja, não tem nenhum Rui Barbosa entre a verdadeira classe dominante do país. Entre o empresariado também a coisa não é muito diferente. Então, resta a pergunta: quem é essa tal classe dominante que tem a variedade padrão como matriz? - Será que são os professores de gramática e redação? Acho que um olhadinha no contracheque deles responderia tal pergunta.      

Vamos dar mais um pequeno exemplo. Em polêmico material do MEC sobre ensino de língua portuguesa, encontramos a seguinte “descrição” em um capítulo voltado para a temática da variações dialetais;

Os livro ilustrado mais interessante estão emprestado

Nem precisa ser especialista para  discordar de tal “descrição”, ela não configura nenhuma variação dialetal do português falado no Brasil, é apenas um português hipotético que só existe na cabeça dos ideólogos ligados ao MEC. O que era de se esperar seria algo do tipo: 

Os livro ilustrado mais interessante tão emprestado

Conclusão, antes de apresentar uma abordagem alinhada com a lingüística, preferiu-se ficar no discurso fácil inspirado por Pierre Bourdieu. Cumpre ainda lembrar que a Associação Brasileira de Lingüística se posicionou prontamente em defesa do material, sem fazer nenhuma ressalva a respeito das evidentes imprecisões nas análises lingüísticas nele contidas, nenhum membro da ABRALIN mencionou o óbvio: que a análise estava ruim. - Nada de morfologia, sintaxe ou lexicografia. Marx neles...        

¹ Entenda-se: padrão lingüístico ou variedade padrão